Muitos têm sido os artigos que dissertam sobre uma eventual sociedade pós Covid-19. No entanto, a história da cidade, apesar das epidemias e convulsões, manifesta-se principalmente pelos seus traços culturais e históricos, permanecendo muito para além destes acidentes.
Provavelmente teremos uma perspetiva socio-económica diferente, uma aceleração para uma vida mais sustentável, uma maior sensibilização para a economia local e para o impacto das importações, mas será que essa gestão se vai manifestar no desenho das cidades e do território?
Boa tarde.
Já há algum tempo que não trazemos cá nada.
Segue uma entrevista ao Sir Norman Foster acerca do tema deste tópico:
https://www.dezeen.com/2020/10/13/coronavirus-covid-19-norman-foster-cities/?utm_source=feedburner&utm_medium=feed&utm_campaign=Feed%3A+dezeen+%28Dezeenfeed%29
Porque o tema está na ordem do dia, deixo aqui um convite a todos/as.
Um Webinar no dia 1 de Junho, pelas 15h, promovido pelo grupo de investigação URBinLAB/FA-ULisboa e pela APAP - Associação Portuguesa dos Arquitectos Paisagistas.
São nossos convidados/as:
- Fernanda do Carmo (DGTerritório)
- Jorge Cancela (APAP e URBinLAB/FA-ULisboa)
- João Rafael Santos (URBinLAB/FA-ULisboa)
- David Vale (URBinLAB/FA-ULisboa)
- Arminda Deusdado (Biosfera - RTP)
Moderação de Cristina Cavaco (URBinLAB/FA-ULisboa).
Sejam bem-vindos nestes links:
www.fa.ulisboa.pt/streaming
http://urbinlab.fa.ulisboa.pt/images/2020/URBinLAB_COVID_2020.pdf
http://urbinlab.fa.ulisboa.pt/
A tendência espelhada nestes artigos é muito interessante. Gostaria de perceber se isto resulta pela alegria natural de sair de confinamento e de descobrir o verão a chegar cá fora ou se, de facto, vai pegar de forma estrutural. Antes do confinamento seria muito complicado assumir medidas destas. Agora parece natural, quem aproveitar o momento pode implementar melhor este tipo de medidas.
https://www.theguardian.com/uk-news/2020/may/15/large-areas-of-london-to-be-made-car-free-as-lockdown-eased?utm_medium=website&utm_source=archdaily.com
Agora Londres!
Interessante de ver e ouvir, sobre este assunto:
https://www.youtube.com/watch?v=Iep3iWiJXgs
https://monocle.com/radio/shows/the-urbanist/445/
https://www.archdaily.com/938870/paris-plans-to-maintain-anti-pollution-and-anti-congestion-measures-post-covid-19-lockdown
Paris que já anuncia a manutenção das medidas em espaço urbano, pós-covid!
As cidades são de facto organismos mais lentos e multicelulares que um centro comercial. Mas mesmo em Portugal já há reações que alteram o seu funcionamento, e que poderão deixar algumas fundações para o futuro: o Porto e a Póvoa de Varzim (que conheço, deverá haver muitas mais) fecham as suas marginais ao fim de semana ao trânsito automóvel, passando o peão a usar toda a plataforma. Várias cidades (incluindo Lisboa) promovem um aumento da área de esplanadas, reduzindo ou anulando a respetiva taxa, para que estas tenham áreas convenientes para a garantia do distanciamento, usando áreas anteriormente afetas à circulação motorizada. O município da Régua, já anunciou a circulação nos passeios apenas num sentido! Mais uma vez, são soluções presumivelmente temporárias, mas será que vamos querer regressar ao anteriormente? As visões futuristas ou fantasiosas sempre serviram como semente de soluções que surgiram anos mais tarde, por isso, concordo, não deixa de dar que pensar.
Concordo!
A resposta num contexto de Covid não será tanto a do redesenho da cidade enquanto modelo mas a da cirurgia urbana para ajustar a cidade a este modo de confinamento ou distanciamento social.
Passeios mais largos fazem com que menos pessoas se cruzem e ter menos carros equivale a ter mais espaço de passeio, por exemplo. Mas por outro lado o transporte individual é mais "confinado" que o transporte público pelo que poderá sair naturalmente reforçado.
Gerir estas duas posturas poderá ser difícil.
Uma coisa a que acharia graça é que o centro comercial voltasse a ser predominantemente no espaço de rua ao ar livre.
Mas o comércio tradicional está menos organizado que o do centro comercial. O centro comercial investirá rapidamente em soluções arquitectónicas, relacionadas com medidas de comprimento, compartimentação de espaço ou definição de regras muito mais rapidamente do que o de rua. O centro comercial é gerido por uma entidade que sabe que se tem de adaptar ou perde competitividade. O seu contexto monofuncional e privado é menos abrangente que o do espaço público da cidade, pelo que o seu campo de actuação é mais reduzido e objectivo.
Numa rua de cidade o espaço é colectivo e gerido pelo município que tem de gerir muito mais questões do que apenas a do comércio e que usa esse espaço público para muito mais funções que têm de se intersectar e coexistir, pelo que a sua optimização comercial ficará prejudicada.
Há muitas ideias divertidas que me surgem também, que são mais de ficção científica humorística do que propriamente pragmáticas. Fica uma:
Fazer faixas de circulação nos passeios pedonais em que haja sentidos viários, traços contínuos e descontínuos e até semáforos para que as pessoas não se intersectem.
Na rua é ridículo, mas sabe-se lá? E no Colombo será que só se poderá vir a circular num só sentido? Será que isso não pode ser promovido por tapetes rolantes? Um grande carrocel comercial? Onde se passeia parado, de saco na mão e hamburguer na outra?
Não deixa de dar que pensar nem que seja só um bocadinho.
É um tema interessante.
Não me parece ser tão linear. Se pensarmos nas operações ocorridas em grandes cidades que trouxeram ou implementaram novos modelos de desdenho de território, notamos que a saúde e a higiene foram determinantes na sua configuração, ou pelo menos, no abandono de um modelo em favor de outro. Se Cerdá em Barcelona ou Haussman em Paris são paradigmas de novos modelos, por cá, se Lisboa foi reconstruída (baixa) por força de uma catástrofe natural (Marquês de Pombal), já o Porto herdou esse espírito renovador (João de Almada), e implementou o modelo com o objectivo de higienizar a cidade - recorde-se Ricardo Jorge e o episódio da peste no Porto. Hoje a questão do distanciamento físico, do transporte (público e privado), do digital e do trabalho à distância, vêm somar-se (e até repetir-se) às questões de sustentabilidade que têm alimentado o discurso de urbanistas e outros pensadores da cidade.
A adaptação das cidade é lenta, e reativa. Não sendo esta circunstância acompanhada de catástrofe física, não havendo devastação do espaço construido, não será de prever a implantação de novos modelos como os que referi. Mas a adaptação já se publicita, e apesar de se presumir temporária, não sabemos o que vai sobrar das opções que estão a implementar cidades como Barcelona ou Milão: diminuir o espaço da circulação automóvel, para aumentar o espaço da circulação de peões e modos suaves. Responde no imediato à questão do distanciamento físico, e a uma outra escala, à dimuição das emissões de carbono. O ar das cidades será concerteza melhor. Voltarão atrás?
O desenho da cidade é um acto contínuo.
Produz-se desenho da cidade por aferição do que já está produzido. A cidade adapta-se.
O que se pode tentar fazer quando se propõe cidade nova é analisar com os dados do contexto actual, se a cidade que se desenha pode vir a estar preparada para todas as circunstâncias previsíveis. Mas quando as circunstâncias mudam ela tem de ter capacidade de aferição. E as circunstâncias estão sempre a mudar pelo que a cidade boa é a que seja a mais flexível, mais adaptável, mais inteligente e mais capaz de potenciar a vida humana enquanto muda.
Se isto acontece lentamente e progressivamente em períodos "normais", em períodos de crise, de guerras, de catástrofe, a adaptação da cidade tem de ser muito rápida e pode ser difícil enquadrar essa necessária adequação na estrutura do desenho da cidade.
Aliás é preciso entender que o desenho da cidade não é feito de fora para dentro com a visão estática de quem produz um desenho ou uma escultura. É feito dinamicamente primeiro, porque a cidade tem um alcance territorial muito maior que aquilo que se pode desenhar. Porque a forma como se vive é que a tem de desenhar, não a mão abstrata de um arquitecto que desenha uma grelha bonita com proporções correctas. Porque a evolução tecnológica possibilita novos modos de experienciar a sociedade e logo a cidade adapta-se a isso. O que é necessário é que se adapte e, se possível melhore sempre.
Lisboa, por exemplo, está a ser desenhada agora não pelo desenho das suas ruas, dos seus edifícios e das suas fachadas, mas pela mão do vírus que desenhou a ideia de que os aviões não levantam voo em Nova Iorque para aterrarem na Portela e os turistas não passeiam à beira Tejo. Desenhou a ideia de que ficamos à espera fora do supermercado enquanto dois clientes fazem as compras escondidos na máscara. De que os nossos filhos não vão à escola e ficam em casa a estudar com os pais. Que os pais deixam de ser pais para passarem a ser um híbrido desfuncional entre professores, trabalhadores e pais.
Para isto a cidade não estava preparada.
Não querendo exercer futurologia, o que pode estar em causa na sociedade pós Covid é uma de três coisas:
1 - O regresso à vida normal, pelo aparecimento das vacinas ou métodos de tratamento;
2 - O ressurgimento contínuo de uma onda pandémica;
3 - O surgimento de uma outra crise qualquer para a qual não estamos preparados (por exemplo um terramoto, a subida do nível das águas do mar pelo aquecimento global, outra doença qualquer, uma guerra...).
Se no primeiro caso a adaptação das cidades será quase desnecessária, no segundo caso a alteração do modo de vida da cidade e até do próprio desenho da cidade em função das novas regras de convivência social, pode ter se adaptar aceleradamente. A cidade dificilmente mudará de forma, mas pormenores da cidade, das suas casas, do modo de habitar os espaços privados e públicos pode mudar para uma forma estranha mesmo muito diferente e que pode ter pouco paralelo na história da cidade. Quando isto aconteceu anteriormente deixou marcas evolutivas claras e, geralmente positivas, porque melhoraram a cidade contribuindo para auxiliar as necessidades da sociedade.
E o terceiro caso?
A primeira coisa a fazer é não desenhar a cidade de forma absolutista como se tudo tivesse de ser resolvido nesse desenho, mas sim de uma forma aberta e que possibilite ao máximo a evolução da cidade, a sua adaptação, a sua liberdade de expressão, o potenciar do modo de vida, a luz e a salubridade e, se tiver de ser, as novas e estranhas regras que vão reger a convivência social para sempre...
A cidade deve ser desenhada em liberdade e democracia, não com controlo absoluto mas sim com responsabilidade e zelo.
A segunda coisa a fazer é corrigir as patologias graves de que a cidade padece e que estão bem identificadas mas nunca em que nunca se actua. É necessário prevenir que crises futuras não tenham impactos maiores do que o necessário.
A terceira coisa a fazer é meter a gente que sabe pensar a cidade a pensar a cidade. Que se faça o melhor que se possa fazer agora, porque essa será, em princípio a melhor Cidade e a que melhor se possa vir a adaptar depois.
Este investimento no melhor possível, não está a ser feito. O que está a ser feito é o menor investimento possível. A cidade está a ser esmifrada, não está a ser pensada e o Covid só veio pôr isto em evidência.
Seguramente. Mas o desenho da cidade não é uma coisa imediata. Teremos certamente uma aceleração da integração da digitalização, com a consequente disfuncionalização física das actividades, o que se traduz noutros modos de vida, e numa "mutação" do sistema funcional. Enquanto que andar menos de transportes públicos" será fruta da época, mais tele-trabalho uma mudança para ficar, assim como mais consumo digital (na processo de compra e nos produtos).
https://www.ambientemagazine.com/ficis-smart-cities-e-a-necessidade-de-reinvencao-no-pos-covid-19/